terça-feira, 19 de junho de 2012

. Livro do Esquecimento - Parte I .

Acordei totalmente introspectiva hoje. Partindo do principio que tenho uma introspecção nata, carga dada por um signo melancólico e saudosista, é relativamente natural me sentir na contramão.
Dias cinzas agitam as coisas dentro de mim, proporcionalmente, são os que mais amo.
Gosto do que está vivo, quente, mexendo... por mais contraditório que possa soar.
(Acho que não é necessário reafirmar o quanto sou contraditória e caótica.) 
Hoje acordei com saudade do que eu pude ser quando criança, do quanto a vida me parecia doce e sutil, de como eu não me conformava com os horários estabelecidos pelos meus pais, com as regras de idade pra ver filmes (mesmo que eu sempre arrumasse um jeito de burlar as leis adultas). Acordei com saudade de mim, dos que passaram, dos que eram indispensáveis e que daria a vida ou o dente em uma briga, apenas para tê-los por perto.
Quando somos crianças, tudo é muito imediato, intenso.. e parece que a medida que crescemos, transformamos a energia que temos em reclamação, as necessidades sadias em constante infelicidade por não tê-las, a intensidade se perde no caminho e sentimos a vida amargar, emudecer. Os gritos são internos e nos encontramos sempre com a sensação de que estamos vazios, incompletos.
Por onde anda nossa jovialidade? Os sonhos e a vontade de mudar as coisas?
As vezes eu sinto como se tudo que lutei fosse se perder no ar, como se pudessem formatar meus pensamentos e apagar de minhas as cicatrizes de tudo que vivi. Eu tenho medo.
Temo pelos que se foram, pelos corações partidos e pelas lembranças abaladas pelo tempo. Eu não quero esquecer de tudo que me fez chegar até aqui e ser o que eu sou.
Eu amo tanto os meus fracassos quando os meus acertos, eles fazem parte de mim. 
Olho pra trás e vejo como eu errei e erraram comigo e agradeço por cada lágrima, por cada vez que pensei "o que eu faço da minha vida agora?" ou "como puderam fazer isso comigo?". Eu sou um acúmulo de sensações erradas, de projetos falhos e de um amor imensurável pelo desconhecido. Simplesmente vou.
Quando eu era criança e algo não dava certo, ouvia alguma musica que gostasse e pensava em dormir, porque tinha certeza que quando eu acordasse, tudo estaria melhor. Normalmente estava, porque eu tinha fé e nada me fazia acreditar o contrário.
Ontem eu tentei fazer isso, o primeiro obstáculo foi: eu não tinha tempo pra dormir aquela hora. O telefone tocou, clientes no trabalho, e-mails chegando. Eu precisava estar no meu quarto ou em algum colo macio, mas a vida tem sido mais complicada, o tempo não tem mais o mesmo peso que há 10 anos atrás.. era só correr e pronto, eu chegava num lugar comum e meu coração se aquietava lentamente, até esquecer.
Tenho dado prioridade demais aos outros, ao que não é meu e tenho me renegado pelo menos 3 vezes ao dia.
Me sinto como Pedro negando Jesus. "Não, eu não conheço", "não sei quem é", "não estou com ela". 
E as vezes, sou um tanto Judas e com um beijo traidor me entrego pro inimigo. O tempo.
Fé.
Acho mesmo que perdi a fé nas pessoas que admirava, que ando gostando mais de bicho, música, recordações. Tudo pra não deixar de acreditar na vida. Mesmo que não seja nas pessoas, eu preciso acreditar em alguma coisa.
Eu sei que em algum canto do mundo, alguém sente a mesma coisa que eu e me entende. Isso basta agora, saber que por mais que eu me afaste, não estou sozinha. Há uma interligação entre nós.
Também tenho medo de que esqueçam quem eu sou.
Meu maior medo é o esquecimento.
Hoje vou lembrar de como era gostoso ter o mundo todo pra descobrir e acreditar que ainda dá tempo de reinventar nossa própria história. Por isso escrevo, pra salvar, matar ou morrer.
Botar pra fora e trazer pra dentro o que falta.
Assim cruzamos olhares, caminhos, parágrafos. Perdemos, achamos, ganhamos, enganamos.

Se um dia eu voltar a ser criança, venho correndo contar pra vocês.